Na Terra de Inácia
Vaz, um romance
*Por Francisco Carlos
Machado
No romance “Na Terra de Inácia Vaz”, de Walfrêdo
Machado, publicado em 1975, pela Artenova, no Rio de Janeiro, a análise
sociológica dita no paragrafo acima, sobre a intelectualidade e o ambiente
literário buritiense é mostrada com mais aprofundamento. Entretanto, nosso
texto objetiva analisar, essencialmente, a obra citada de Machado, que já
senhor de idade, tendo no currículo dez livros – em sua maioria ensaios
literários - publicou seu primeiro romance, no qual o mesmo afirma ser uma
reminiscência, dando entender ser a obra um romance autobiográfico de momentos
idos vividos em sua adolescência. Ao lançar esse romance (aliás, a primeira
obra do gênero ambientada em nossa região), seu autor, um maranhense nascido em
Caxias, além das outras obras, também era membro da Federação das Academias de
Letras do Brasil; da Associação Brasileira de Imprensa e do o Sindicato de
Escritores do Estado do Rio de Janeiro, onde ele viveu boas partes de sua vida.
Então, do que de fato trata o romance Na
terra de Inácia Vaz? Qual seu enredo? Quem são os protagonistas?
Ambientado em Buriti, o ano e tempo histórico
desse romance ocorreu entre 1914 a 1918, no período da 1º primeira grande
guerra. O protagonista da obra, Cláudio, “rapazinho” que logo ao terminar o estudo
primário na Escola do Estado em Caxias, a pedido das suas tias ao Coronel
Gustavo Miranda (uma das pessoas mais consideradas de Buriti, possuía terras,
fazendas, era comerciante e chefe político) viaja na companhia do mesmo num navio
gaiola, descendo rio Parnaíba, para passar “umas férias que lhe seriam
proveitosas” na cidade. As férias de Cláudio em Buriti duraram um ano e meio, e
neste período ele viveu experiências e conheceu pessoas significativas, uma
espécie de rito de passagem da infância para a adolescência, marcando profundo sua
vida.
As reminiscências de Cláudio no romance são
narradas na terceira pessoa, em capitulo breves, constando o “Rumo à terra de
Inácia Vaz” (sobre a ida ao lugarejo pelo rio, a cobra que caio dentro do gaiola Floriano que acomodava até 80
passageiros); no qual tomaram
A
grande estrada e era noite quando atingiram o centro da povoação. As ruas não
tinham calçamento. Podiam-se entrever à frouxa claridade de dois ou três
lampiões de querosene (...) Na passagem
pela via principal, Cláudio olhou a Igreja e benzeu-se. Encontrava-se em Buriti
(MACHADO, pág. 13).
E sobre a “A Vila”, terra estranha ao
rapazinho, onde ele irá ambienta-se ao pequeno e pitoresco lugar de “uns
cinco mil habitantes”, se descreve que a
topografia
assemelhava-se a um vale coberto de juçarais e recortado de riachos rolando
entre baixos morros que se alongavam e subiam até o chapadão agreste.
Paralelas, estendiam-se duas extensas ruas, uma beirando o lado direito da
cadeia de morretes que ia até o Tubi, delicioso córrego ensombrado de
palmeiras, usado pelas lavadeiras e onde grande parte da população se banhava,
e outra, a principal, onde se localizam as melhores casas residenciais e as do
comércio (MACHADO,
pág. 15).
São tempos distantes sim, certamente, a do
romance, o Tubi hoje é um filete d’água soterrado, mas o centro de Buriti
continua com suas “lojas”, onde numa dessas “ A Loja”, que Cláudio vai conhecer
e interagir inicialmente com as personalidades carismáticas da cidade, como vaqueiros e lavradores, “quase
todos correntistas da firma”, que traziam cofos de algodão pra vender, até
peles de veado e caititu; como figuras
como o português Albano Vilares, homem
de sete instrumentos, jornal falante da vila, pois era sabedor dos fatos e
fofocar correntes.
No
romance os demais personagens que movem a narração, moradores do lugar, são cidadãos
de bem, educados, possuindo elevadas e características positivas. Cita-se comerciantes,
o promotor público, o maestro, estudantes de direitos e seminaristas da cidade
que viajam a Buriti no período que Cláudio lá morou, como pessoas de classes
menos afortunadas, como a empregada que o menino tentou ter uma noite de
prazeres nos fundo de um quintal, mas interrompido devido o alarme de um cão.
Existe no mesmo até um filósofo liberal, filho de família conceituada que nesta
época defendia o divórcio, fazia discursos sobre a alma humana e a força do
amor, acabando o mesmo se juntando a uma morena rapariga, causando pequeno escândalo
na sociedade buritiense.
Walfrêdo leva Cláudio a viver os encontros
sociais locais: bailes familiares, saraus, o festejo de S’antana, descrevendo
hábitos e costumes dos moradores. E
nestes eventos que ele conheceu Ângela, vindo à mesma ser sua primeira grande
paixão da vida. Uma paixão que não pode ser vivida, pois o rapaz teve um
concorrente forte, Eduardo, estudante de direito da cidade, que ganha à concorrência,
tendo o apoio da família e os buritienses, principalmente quando lhe dedica um
poema no Jornal “A Voz”, produzido no lugar. E em “Iniciação”, Cláudio vai ter
sua experiência de amor com uma mulher solteira, disponível aos prazeres
carnais dos jovens do lugar.
Embora
seja um pequeno romance, dividido em quinze capítulos, escrito numa linguagem formal,
usando às vezes a voz passiva e simples do caboclo local, a obra “Na Terra de
Inácia Vaz”, possui um valor literário/histórico que faz o leitor conhecer mais
deste momento social e psicológico que Cláudio experimentou, no qual teve
que abandonar partido numa sofrida viajem em lombo de burro até São Luís, no
intuito de continuar os estudos e a vida. Porém, o Buriti, sua experiência e
suas vivências, com sua gente gentil e trabalhadora, serão lembranças permanentemente
do coração do protagonista, fazendo muito anos depois o autor registrar algumas
delas em nosso primeiro romance regional.
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Coluna literária