De acordo com o SNIS, 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada e cerca de 100 milhões não têm rede de coleta de esgoto
O Senado
aprovou nessa quarta-feira 24/6 o Projeto de Lei (PL) 4.162/19, que trata
do novo marco do saneamento. O projeto já havia passado pela Câmara, após muita
discussão. Agora segue para sanção presidencial. O projeto viabiliza a injeção
de mais investimentos privados no serviço de saneamento. Hoje, em 94% das
cidades brasileiras, o serviço de saneamento é prestado por empresas estatais.
As empresas privadas administram o serviço em apenas 6% das cidades.
Com a proposta,
empresas privadas também poderão participar de licitações do setor. Atualmente,
prefeitos e governadores podem optar pela licitação ou por firmar termos de
parceria diretamente com as empresas estatais. Se sancionado o projeto
pelo presidente da República, as empresas estatais não poderão firmar novos
contratos para a prestação do serviço sem participar de licitação junto com as
empresas privadas.
O projeto prevê
também que os atuais contratos em vigor poderão ser prorrogados por mais 30
anos, desde que as empresas comprovem uma saúde financeira suficientemente boa
para se manterem apenas com a cobrança de tarifas e contratação de dívida. Além
disso, as empresas devem ampliar o fornecimento de água para 99% da população e
acesso a esgoto para 90% da população.
Universalização dos
serviços
O relator da
proposta no Senado, Tasso Jereissati, afirmou que o propósito do projeto é
universalizar a prestação de serviços de saneamento no Brasil. Ou seja,
garantir o acesso de todos os municípios a água tratada e coleta de esgoto.
Para que isso ocorra até 2033, ele estima serem necessários entre R$ 500
bilhões e R$ 700 bilhões em investimentos.
Um dos mecanismos
inseridos pelo projeto para universalizar o sistema de saneamento no país é a
prestação regionalizada. Assim, empresas não podem fornecer serviço apenas para
os municípios de interesse delas, que gerem lucro. A prestação regionalizada
inclui municípios mais e menos atraentes e não necessariamente contíguos em um
mesmo território de prestação.
O PL também
estabelece um prazo para o fim dos lixões no país. Para capitais e regiões
metropolitanas, esse prazo é 2021; para cidades com mais de 100 mil
habitantes, o prazo é 2022. Já em cidades entre 50 e 100 mil habitantes, os
lixões devem ser eliminados até 2023; e em cidades com menos de 50 mil
habitantes, o prazo é 2024.
População
desabastecida
Segundo levantamento
de 2018 realizado pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS),
35 milhões de brasileiros (16,38%) não têm acesso à água tratada e cerca de 100
milhões (47%) não têm rede de coleta de esgoto. “Essa modernização é
absolutamente necessária e urgente. Conforme já apontaram pareceres sobre as
matérias mencionadas, o modelo institucional do setor precisa ser otimizado de
modo a superar os graves índices hoje observados no Brasil”,
explicou o relator da matéria, Tasso Jereissati (PSDB-CE), em seu parecer.
A epidemia de
covid-19, por sua vez, reforça os argumentos dos defensores do projeto, uma vez
que as práticas de higiene, como lavar as mãos, estão entre as formas eficazes
de prevenir o contágio e milhões de brasileiros ainda não têm acesso à água
tratada. “Enquanto órgãos de saúde pública de referência no plano
internacional e no Brasil recomendam que se lavem as mãos com frequência para evitar
a contaminação com o coronavírus, temos 35 milhões de brasileiros sem acesso à
água tratada. Um grande e potencialmente letal paradoxo”, argumentou o
relator.
Alguns senadores
questionaram a efetividade da proposta. Para Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB),
o projeto não garante que a população seja realmente beneficiada com a
privatização dos sistemas de saneamento. “Eu não tenho segurança que essa
universalização chegará de fato aos rincões. É muito comum a simploriedade de
utilizar o caos, como nós temos, para as soluções quase messiânicas”.
Mecias de Jesus
(Republicanos-RR) acredita que a privatização deverá aumentar as tarifas de
fornecimento de água e esgoto sem que haja melhora visível no serviço. Ele usou
como exemplo o serviço de distribuição de energia em Roraima que, segundo ele,
é caro e de baixa qualidade. “A privatização resultou na demissão de
centenas de servidores e na entrega de um patrimônio de mais de R$ 1 bilhão por
míseros R$ 50 mil. Hoje o Roraimense paga a tarifa de energia mais cara
do Brasil pelo pior serviço prestado”.
Já o líder do
governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), mostrou apoio ao projeto. Ele
considera que o novo marco do saneamento poderá expandir a rede e oferecer
serviços a toda população. “O objetivo deste projeto é ampliar os
mecanismos que levem à expansão da rede, inclusive por meio da prestação
regionalizada dos serviços. Esse é o caminho para recuperar o tempo perdido e
modernizarmos um setor estratégico para alavancar a economia brasileira”.
CNI comemora
aprovação
A Confederação
Nacional da Indústria (CNI) comemorou a aprovação. Para ela, o novo marco do
saneamento vai modernizar o setor. “O novo marco legal do saneamento básico
modernizará o setor de maior atraso da infraestrutura nacional e permitirá o
aumento dos investimentos nas redes de coleta e tratamento de esgoto e de
abastecimento de água. Essa é uma condição imprescindível para que o Brasil
caminhe na direção de universalizar os serviços de saneamento”, disse a
entidade, em nota.
Para a entidade, o
aumento da concorrência trazido pela nova lei poderá dar um “choque de
eficiência” em estatais com rendimento abaixo do necessário, além de permitir a
entrada de capital privado no setor de saneamento. “A abertura de espaço para a
iniciativa privada atuar na exploração do setor, possibilitará a atração de
grandes investimentos e a geração de, pelo menos, um milhão de empregos em
cinco anos”, disse o presidente da CNI, Robson Braga.