*Por
Benedito Ferreira Marques
CONJUGAR
O VERBO ORIENTAR
O
ano de 2020 mal começou, e já se apontam escorregões da maior autoridade
brasileira na área da Educação. A mídia espalha que o Ministro da Educação
teria postado, em sua conta no twitter,
alguma mensagem em que teria escrito a palavra “INTEREÇANTE”. Assim mesmo, com “C” cedilhado. Não sei que mensagem
foi postada, nem a quem foi endereçada
(poderia escrever com dois esses, ou não?) O que importa é
a escorregadela feia de quem não se esperava. Mas errar é humano – diria o seu
eventual defensor. Afinal, os romanos já diziam, em Latim: errare humanum est.
É
evidente que esse tipo de erro sempre soa mal, ainda mais quando se trata de
uma autoridade tão importante, justamente na pasta, cuja performance não vem
agradando, a não ser a uma parcela marcadamente fanática da população, que tudo
vê e aplaude no atual governo federal. Respeito, pois cada cidadão tem o
direito de agir, pensar e expressar-se como quiser. Vivemos numa democracia.
Tenho certeza de que já cometi erros de ortografia, de regências e concordâncias
verbais, de gramática em geral, em meus livros e escritos. Devo ter sido
gostosamente criticado, embora não me tenham dito nada. Fazer o quê? Mas, não por isso, perdi o direito de
criticar quem também erra. Dou-me esse direito, como cidadão. Responsabilizo-me
pelos meus erros e críticas. Afinal –
repito – vivemos numa democracia, o que significa dizer
que estamos no “estado democrático de direito”. Fernando
Pessoa nos ensina: “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena”. A minha crítica tem a virtude de ensinar,
apontando erros. Sempre agi assim, nos meus 33 anos de magistério. E aprendi
também com os erros apontados por meus alunos.
O processo ensino-aprendizagem é assim. O professor ensina e aprende
também. Quem não admitir essa verdade não é professor. Certa feita, um aluno
escreveu em uma prova por mim aplicada: “feixou” (certamente queria escrever
“fechou”), mas a resposta à questão estava correta. Atribuí-lhe os pontos a que
tinha direito, mas não sem fazer uma observação, com caneta de tinta vermelha,
ao final da folha, chamando-lhe a atenção para o erro. Penso que nunca mais ele
errou a conjugação do verbo FECHAR.
O episódio de que me ocupo nesta narrativa, porém, me levou
de volta aos tempos acadêmicos, anos 60 do século passado. Contava-se, à boca
pequena, na Faculdade de Direito de São Luís, no Maranhão – quando não havia,
ainda, Universidade -, que um acadêmico muito querido dos seus colegas,
conhecido por “Gonzaga”, não conseguia passar nas provas da disciplina Economia
Política. Tentara as duas vezes que eram permitidas ao reprovado. Um grupo de
colegas de turma, então, resolveu ir ao professor daquela disciplina, a quem
lhe fizera um apelo para dar mais uma chance ao Gonzaga. O mestre, conhecido
por sua dureza, sensibilizou-se com o apelo e decidiu marcar uma prova oral com
o Gonzaga.
- Senhor Gonzaga, os seus
colegas me pediram para lhe conceder mais uma oportunidade, para que você passe
na minha disciplina. Vou lhe fazer apenas uma pergunta. Se acertar, passará, e
você seguirá seu curso. Senhor Gonzaga, o que é empresário?
- Professor, empresário e
aquele que.... (fazia movimentos com as mãos, como se estivesse moldando uma
bola enorme.). Repetia os gestos, e o
resto da resposta não saía.
- Vamos, senhor Gonzaga, eu
sei que você sabe.
- Sei, professor.
Empresário é aquele que... (continuava os mesmos gestos, inutilmente). E os
colegas, aflitos, esfregavam as mãos em torcida frenética, quase soprando. A
resposta
- Vamos, “seu” Gonzaga;
está quase acertando...
- Professor, empresário é
aquele que....
- Vamos, Gonzaga, conclua.
- É aquele que ORIENTEIA a atividade
empresarial.
- Senhor Gonzaga, eu lhe
dei uma chance a pedido dos seus colegas; você a desperdiçou. Volte para fazer
novo vestibular, para aprender a conjugar o verbo ORIENTAR.
SOBRE O AUTOR
BENEDITO FERREIRA MARQUES nasceu no dia 11 de novembro de 1939, no povoado Barro Branco, no município de Buriti/MA. Começou seus estudos em escola pública e, com dedicação, foi galgando os degraus que o levariam à universidade. Possui graduação em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (1964), especialista em Direito Civil, Direito Agrário e Direito Comercial; mestre em Direito Agrário pela Universidade Federal de Goiás (1988); e doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2004). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Comercial, atuando principalmente nos seguintes temas: direito agrário, reforma agrária, função social, contratos agrários e princípios constitucionais. NA Universidade Federal de Goiás, foi Vice-reitor, Coordenador do Curso de Mestrado em Direito Agrário e Diretor da Faculdade de Direito. Na Carreira de magistério, foi professor de Português no Ensino Médio; no Ensino Superior foi professor de Direito Civil, Direito Agrário e Direito Comercial, sendo que, de 1976 a 1984, foi professor de Direito Civil na PUC de Goiás. Acompanhou pesquisas, participou de inúmeras bancas examinadoras de mestrado, autor de muitos artigos, textos em jornais, trabalhos publicados em anais de congressos, além de já ter publicado 12 livros, entre eles “A Guerra da Balaiada, à luz do direito”, “Marcas do Passado”, “Direito Agrário para Concursos”; e “Cambica de Buriti”; entre outros.
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