Aos 35 anos, Maritana
Silva dos Santos Neta vive o sonho que tem desde os 16 anos: cursar engenharia
civil. Indígena do povo Tuxá de Banzaê (BA), ela sempre quis ter um curso
superior no currículo e ajudar a comunidade, mas a falta de recursos sempre foi
um empecilho.
“É uma grande chance
para mim, que queria desde os 16 anos, mas não consegui. Terminei o ensino
médio com 18 anos, mas meu pai não podia, na época, bancar os meus estudos. A
parte financeira é o grande problema. Tenho primos que começaram a estudar e
tiveram que trancar a matrícula pelo custo”, diz.
Com uma bolsa de 50% na
Faculdade Zacarias de Goés, em Valença (BA), a estudante conseguiu começar a
estudar e resolveu se mudar para a nova cidade com o marido e a filha de 8
anos.
“Eu tenho consciência
que o mercado não está fácil agora para engenharia e construção, mas acredito
que vai melhorar. Entrei na faculdade com foco em construções sustentáveis.
Quero levar isso para minha região, para perto da minha família, para poder
ajudar de alguma forma”, explica.
Maritana é uma dos 56,7
mil indígenas matriculados no ensino superior do país, número que representa
0,68% do total de 8,3 milhões de estudantes matriculados nessa etapa, de acordo
com o último Censo da Educação Superior do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), de 2017. Assim como Maritana, a
maioria dos indígenas (42,8 mil) está matriculada em instituições particulares
de ensino superior.
Apesar das dificuldades
enfrentadas ainda hoje para ingressar e para se manter no ensino superior,
levantamento do site Quero Bolsa, plataforma
online em que estudantes podem obter descontos de instituições de ensino,
mostra que, enquanto o total de ingressantes no ensino superior brasileiro
avançou 48% desde 2010, a entrada de estudantes indígenas nas faculdades
brasileiras deu um salto muito maior.
Em 2010, 2.723 alunos
calouros que se declararam indígenas se matricularam nas faculdades. Em 2017,
dado mais recente disponível, foram 25.670, número 9,4 vezes maior.
“O que a gente conclui é
que esse aumento está muito atrelado à política de cotas. Precisamos oferecer
educação para esses jovens e condições para entrar no ensino superior”, analisa
o gerente de relações institucionais do Quero Bolsa, Rui Gonçalves.
Pela Lei de Cotas (Lei 12.711/12), 50% das
vagas das universidades federais e das instituições federais de ensino técnico
de nível médio devem ser reservadas a estudantes de escolas públicas. Dentro da
lei, há a reserva de vagas para pretos, pardos e indígenas, de acordo com a
porcentagem dessas populações nas unidades federativas.
Outra política pública
ressaltada por Gonçalves é o Programa Bolsa Permanência, que concede auxílio
financeiro para estudantes em situação de vulnerabilidade econômica. A bolsa
para indígenas é de R$ 900.
Hoje, o percentual de
estudantes indígenas em relação aos demais estudantes (0,68%) é maior que o
percentual total de indígenas em relação à população do país (0,43%), de acordo
com o último Censo, de 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS
Para a coordenadora da
Kanindé - Associação de Defesa Etnoambiental, Neide Bandeira, a presença de
indígenas no ensino superior traz importantes contribuições para a sociedade.
“É um ganho imenso
também para a sociedade não indígena. Eles trazem a carga cultural,
compartilham conhecimento cultural. Passam a interagir mais com outras
sociedades e ajudam a diminuir o preconceito”, diz. Além disso, contribuem
para o desenvolvimento científico do país, pois “passam a desenvolver sua
própria pesquisa, com um olhar indígena”, acrescenta Neide.
Seringueira,
Neide lutou para ter acesso à própria educação. Ela saiu do povoado onde
morava aos 12 anos e foi para Porto Velho estudar. Os esforços da família
renderam frutos e, hoje, ela trabalha para concluir o doutorado em geografia na
Universidade Federal de Rondônia. “Quando vim para a cidade de Porto Velho,
estava determinada a mudar a história contada, na qual os índios sempre se
davam mal. Queria que fossem vencedores. Estudei para mostrar a história pelo
lado daqueles que eram mostrados como vencidos.”
DIA DO ÍNDIO
O dia 19 de abril é
conhecido como Dia do Índio. A data foi instituída em 2 de junho de 1943 pelo
então presidente da República, Getúlio Vargas. O Decreto-Lei número 5.540, que
criou a celebração, foi baseado no Primeiro Congresso Indigenista
Interamericano, realizado no México, em 1940. A medida está registrada no
Diário Oficial da União da época.
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