O
ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu nessa
quinta-feira (1) o projeto de lei que define os crimes de abuso de autoridade e
defendeu a derrubada, pela Câmara dos Deputados, de diversos tópicos das
chamadas “10 Medidas de Combate à Corrupção”, projeto de iniciativa popular
apresentada ao Congresso Nacional pelo Ministério Público. Ele se contrapôs,
assim, ao juiz Sérgio Moro e aos procuradores da força-tarefa da Operação
Lava-Jato, que criticaram duramente os deputados após a aprovação do pacote,
que eles dizem ter sido desfigurado.
Mendes
participa, ao lado de Moro, de uma sessão temática no Senado para debater o
projeto de lei de abuso de autoridade, a convite do presidente do Senado, Renan
Calheiros (PMDB-AL). Momentos antes de Gilmar iniciar sua fala, Moro disse que
não achava que este era o momento apropriado para debater a proposta, em meio
às investigações da Operação Lava-Jato, que têm como alvo diversos políticos de
quase todos os grandes partidos.
“Há
bases hoje muito fortes que legitimam essa iniciativa [lei de abuso
de autoridade]”, disse Mendes. “O propósito não é criminalizar a atividade
do juiz, do promotor, do integrante de CPI no âmbito do Congresso, embora nós
saibamos que isso ocorre.”
Ao lado de
Moro, frequentemente questionado pelos métodos que utiliza na Operação
Lava-Jato, o ministro reiterou a afirmação feita momentos antes por Renan de
que não se deve cometer abusos para combater o crime.
“Eu
gostaria também de dizer que, com a experiência já de anos que nós temos nessas
questões, nesses debates, que nós agentes públicos, agentes políticos do
judiciário, não devemos ceder à tentação de procedermos o combate ao crime
mediante qualquer prática abusiva”, afirmou o ministro.
Mendes citou
um texto do filósofo político italiano Norberto Bobbio (1909-2004), para dizer
que “não fossem aprovadas leis
excepcionais para o combate ao terrorismo, pois isso é um valor do Estado de
direito”.
“Por
isso, também não compartilho da ideia de que este não é o momento azado
[oportuno] para aprovar a lei. Qual seria o momento azado? Qual seria o momento
adequado para discutir esse tema, de um projeto que já tramita no Congresso há
mais de sete anos? Como se fazer esse tipo de escolha do momento?”, disse. “Acho inclusive, juiz Sérgio Moro, com toda
a honestidade intelectual, [...] que a Lava-Jato não precisa de licença
especial para fazer as suas investigações. Os instrumentos que aí estão são
mais do que suficientes, como qualquer outra operação.”
O ministro do
STF prosseguiu dizendo achar adequado “que
se discuta esse projeto com toda a abertura mental, com toda a abertura de
espírito, e que se discuta neste momento”. “Até porque operações vão continuar ocorrendo. Teríamos que, daqui a
pouco, então, buscar um ano sabático das operações para o Congresso deliberar
sobre um tema como esse? Não faz sentido algum. Todos nós devemos ter a
consciência de que devemos atuar dentro dos parâmetros estabelecidos.” “Quanto mais operações nós tivermos, mais
nós necessitamos de limites”, afirmou.
VAZAMENTOS TELEFÔNICOS
Mendes
criticou duramente a divulgação de gravações telefônicas na TV, expediente
utilizado diversas vezes ao longo da Operação Lava-Jato, quando até telefonema
com conversa entre os ex-presidentes petistas Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula
da Silva foi veiculado na televisão.
Ele descreveu
uma conversa com um colega português que dizia achar “engraçado” que os brasileiros
divulguem as conversas na televisão. “Eu
disse: ‘na nossa ordem jurídica não permite, mas a gente se acostumou a essa
violação’. Ele não sabia, ele achava que a nossa Constituição e as leis
autorizavam esse tipo de vazamento, tantas vezes ele passando pelo Brasil havia
visto isso na Rede Globo”, afirmou. “É
preciso que haja limites para isso, de forma inequívoca. É preciso que a gente
chame as coisas pelo nome.”
DEZ MEDIDAS “AUTORITÁRIAS”
O ministro do
Supremo também defendeu algumas modificações impostas pela Câmara às “10 Medidas de Combate à Corrupção”, na
contramão das críticas de diversos setores da opinião pública e dos
procuradores que ameaçaram abandonar a Lava-Jato caso o projeto fosse
sancionado pelo presidente da República.
Além das restrições
ao habeas corpus, Mendes criticou outras medidas derrubadas pela Câmara e que
constavam no projeto apresentado pelo Ministério Público, entre elas a
convalidação de provas ilícitas obtidas “de
boa fé” e o teste de integridade.
Para Mendes, “as propostas populares também têm que ser
escrutinadas”. “Neste ponto, não tenho a menor dúvida. A Câmara andou bem em
rejeitar isso, como andou bem em rejeitar a ideia do aproveitamento de prova
ilícita, como também aquela coisa do teste de integridade, a tal ‘pegadinha’
que se concebeu, de feição claramente autoritária.”
ASSISTA AO VÍDEO DE GILMAR MENDES SE
CONTRAPONDO A MORO EM ABUSO DE AUTORIDADE
(Do Valor)