Depois de percorrerem 9.000 quilômetros e
participarem de 25 audiências na Justiça, jornalistas da "Gazeta do Povo", do Paraná, conseguiram suspender o
andamento das ações por danos morais movidas por dezenas
de juízes e promotores do Estado contra eles.
A decisão de
paralisar os processos, considerados uma "ação
orquestrada" pelo jornal e criticados por entidades de imprensa, foi
dada pela ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), na noite
dessa quinta-feira (30).
"É uma vitória. Nossos cinco profissionais
finalmente voltam a ter uma rotina normal de trabalho, de vida", afirma o diretor de redação da Gazeta do Povo, Leonardo Mendes
Júnior.
Os
magistrados e promotores afirmam terem sido ofendidos por uma reportagem sobre
os "supersalários" da
categoria, publicada em fevereiro. Na avaliação dos autores, a matéria foi "tendenciosa" e "irresponsável", já que
sugeriu que a categoria cometia irregularidades.
O jornal usou
dados públicos para mostrar que, na soma, a remuneração de juízes e promotores
ultrapassava o teto constitucional. A categoria argumenta, porém, que férias,
13° e outros benefícios não se somam ao teto.
Eles entraram
com 48 ações individuais de dano moral em 19 cidades do Paraná – num caso que
lembra a enxurrada de processos de fiéis da Igreja Universal contra a repórter
Elvira Lobato, da Folha, em 2008.
"Os juízes têm total direito constitucional de
entrar com as demandas, embora eu não concorde com o mérito delas. O problema é
o abuso desse direito, numa ação orquestrada para tentar intimidar os
jornalistas. A ministra Rosa Weber mostrou uma vez mais a isenção e a
imparcialidade do STF em matéria dessa natureza, que envolve a liberdade de
expressão", diz o advogado Alexandre Kruel Jobim, que
representa a Gazeta do Povo e seus jornalistas.
Os cinco
repórteres que produziram o material tiveram que viajar por dias a fio, numa
van, para comparecerem às audiências, sob pena de responderem à revelia, o que
acabou inviabilizando seu trabalho por semanas.
As
indenizações pedidas somam R$ 1,5 milhão.
FUNDAMENTOS
A decisão dessa
quinta reconsidera um despacho do final de maio, quando a ministra havia negado
a suspensão dos processos.
A defesa da
Gazeta do Povo argumentava que nenhum juiz do Paraná seria isento para julgar a
causa – 26 deles já haviam se declarado impedidos nas ações, muitos porque
também haviam entrado com pedidos de indenização.
Na época,
Weber entendeu que não havia discussão de interesse da magistratura, e sim de
direitos fundamentais da personalidade de cada autor.
Agora, a
ministra reviu a decisão e decidiu suspender o trâmite dos processos até o
julgamento do mérito da ação no STF.
DIREITO DE AÇÃO
A Amapar
(Associação dos Magistrados do Paraná) defende que os juízes e promotores que
se sentiram ofendidos exerceram seu "direito
de ação", previsto na Constituição.
"A imprensa deve ser livre, mas, se abuso
houver, ele deve ser reparado", informou,
em nota.
Para a associação,
a Gazeta do Povo "extrapolou o
direito à liberdade de expressão" e prestou um "desserviço" à sociedade ao sugerir que a categoria havia
cometido irregularidades ao receber seu salário.
O jornal
afirma que seu objetivo era "expor e
debater o sentido do teto constitucional".
A Amapar, por
sua vez, nega ter articulado uma reação coordenada, embora tenha oferecido
assistência jurídica a quem se sentisse ofendido.
*Da Folha de São Paulo