O aumento de
41,47%%, recentemente o aprovado pelo Senado, torna o Poder Judiciário ainda
mais caro para o brasileiro. A Justiça custou para cada habitante brasileiro
337 reais em 2014.
A
aprovação, na última quarta-feira (29/5) pelo Senado, de um reajuste de 41,47%
para os servidores do Judiciário chamou a atenção para uma questão já há anos
debatida: o alto custo deste Poder no Brasil. Estima-se que o aumento terá um
impacto de 1,7 bilhão de reais para os cofres públicos somente neste ano – e
isso no momento em que o governo federal estima um rombo de cerca de 170
bilhões de reais no Orçamento de 2016.
O aumento
torna o Poder Judiciário ainda mais caro para o brasileiro. As despesas do setor
corresponderam a 68,4 bilhões de reais em 2014, ou seja, 1,2% do Produto
Interno Bruto (PIB). O valor teve um crescimento de 4,3% em relação a 2013, e
de 33,7% nos seis anos anteriores, de acordo com os últimos dados
disponibilizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Em resumo: a Justiça
custou para cada habitante brasileiro 337 reais em 2014.
O governo
Michel Temer argumenta que o aumento para os cerca de 120 mil servidores – que
totalizará quase 22,3 bilhões para o Judiciário e 3,5 bilhões de reais para o
Ministério Público da União até 2019 – já está dentro do planejamento
orçamentário. Ou seja, está contabilizado no rombo. A categoria alega que teve
perdas salariais significativas desde 2008 e aguarda desde 2014 o aumento da
remuneração.
Mas os dados,
de qualquer forma, fazem da Justiça brasileira uma das mais caras do mundo,
segundo o estudo O Custo da Justiça no Brasil: uma análise
comparativa exploratória dos pesquisadores Luciano Da Ros, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e de Matthew M. Taylor, da
American University. A pesquisa usou dados de 2013, quando o Poder Judiciário
custou 1,3% do PIB – valor próximo ao atual.
Segundo o
estudo, 89% da despesa do Poder Judiciário correspondem à folha de salários –
padrão superior à média de 70% nos países europeus. Estes gastos, porém, não se
devem apenas à remuneração de juízes.
O Poder
Judiciário totaliza cerca de 16.500 magistrados, o equivalente a 8,2 juízes por
100 mil habitantes. A cifra é superior a países como Inglaterra (3,8), Chile
(5) e Venezuela (6,8); ligeiramente inferior a de nações como Colômbia (10,4),
Itália (10,6), EUA (10,8), Espanha (11,2) e Argentina (11,4); e
significativamente abaixo de Portugal (19,2) e Alemanha (24,7). Ou seja: a
quantidade de juízes não seria o problema.
Os salários
dos magistrados no país, porém, são altos se comparados aos de outros países.
Segundo a pesquisa, um juiz alemão em início de carreira ganha 1,22 do PIB per
capita e 3,11 no fim da carreira. Já no Brasil, o juiz federal recebe,
respectivamente, 13,1 e 16 do PIB per capita, além de contar com os adicionais
como auxílio moradia. O caso mais próximo do brasileiro é o italiano. No país
europeu, um juiz no início de carreira recebe 2,3 do PIB per capita e, no fim
da magistratura, 6,7.
Mesmo
considerando que os salários dos juízes brasileiros são altos e com pouca
diferença entre o topo e a base, o fato é que a maior parcela do gasto com
pessoal no Judiciário brasileiro se destina ao corpo de servidores, assessores,
terceirizados, cedidos e afins, muitos dos quais com remuneração elevada em
relação à renda média do país.
A força de
trabalho soma cerca de 412.500 funcionários e equivale a 205 para cada 100 mil
habitantes. Em comparação, outros países têm um número bem menor de
trabalhadores: Inglaterra (30,6 por cada 100 mil habitantes), Itália (40,5),
Colômbia (41,6), Chile (42,1), Portugal (58,3), Alemanha (66,9) e Argentina
(150).
Milhões de processos
O alto número
pode ser explicado pela carga de trabalho no Brasil. Segundo Da Ros, a carga de
processo no Brasil, atualmente, é de cerca de 98 milhões de processos e, a cada
ano, chegam 30 milhões de novos processos, o que gera um estoque de casos não
resolvidos de quase 70%.
“Se o Judiciário parasse de receber casos, ele
levaria mais de três anos para limpar a carga de trabalho existente, o que é
uma coisa extraordinária”, afirma.
Ele explica
que o grande número de processos tem alguns motivos. Entre eles, está o fato de
que os casos chegam a ser reexaminados – devido aos recursos impetrados –
diversas vezes ao longo do Judiciário antes da decisão final. Outro fator é que
cada conflito entre partes se transforma em um processo, em vez de um único
processo típico resolver os diversos casos parecidos.
“Essa carga de trabalho muito grande existe porque
muitos dos mesmos casos ou tipos de conflitos se repetem de forma atomizada
dentro do Poder Judiciário”, afirma Da Ros. “Há muito pouco a prática de precedente no
Brasil, ela não é uma prática tradicional do sistema jurídico. A melhor forma é
resolver no ‘atacado’ e não a ‘granel'”, completa.
As outras
formas para resolver o grande número de processos na Justiça seriam por meio de
ações coletivas, em que todas as partes em situações semelhantes se reuniriam
em um único processo; e por meio da súmula vinculante ou repercussão geral do
Superior Tribunal Federal (STF), em que uma decisão da corte vale para todos os
conflitos iguais.
De acordo com
o pesquisador, o STF concedeu repercussão geral para 599 casos até agora.
Desses, já foram julgados 275, que tiveram impacto sobre 90 mil casos e
permitiram que a corte devolvesse para instâncias inferiores outros 120 mil
casos. Quer dizer: com 275 decisões, o STF resolveu controvérsias
constitucionais em outros 210 mil processos semelhantes.
E os outros
324 processos que estão com repercussão geral e ainda não foram julgados podem
fazer com que 1,435 milhão de casos sejam resolvidos. “O STF começou a usar a súmula vinculante e a repercussão geral nos
últimos anos e, com ela, uma decisão resolve os diversos processos iguais. Se a
corte implementar estas decisões, vamos começar a andar numa boa direção”,
conclui.
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